terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

A tua e a minha solidão


Vanessa Mae-Tango de los exiliados-Tribal Gathering-composer Walter Taieb (The Alchemist's Symphony)


Nas asas do pássaro voei meus sonhos
Na imaginação das paisagens inacabadas
Fugindo todos os sepulcros da eternidade
Para que o futuro, o tempo devorasse

Um futuro para ser deslembrado
Na linha invisível do esquecimento

Com tuas cores do tempo repintaria o presente
Redesenhando os desejos no teu corpo de invento
Ao sopro anti-horário de todos os minuanos
Para no passado desesquecido continuar vivendo

Sem esquecer das tuas coisas inacabadas
Sei que tu continuarias acontecendo

Te recriaria numa canção feita de vento
Nos acordes que moram nas folhagens mais altas
Ao compasso das ondas dos teus oceanos
Aos agudos suspiros descompassados de amor

Mas sem o tilintar das taças, de um lado a do amor
E, do outro, a do esquecimento

Te moldaria em madeira nobre
Na janela que guarda todas as paisagens
E que se abre em duas longas asas
Imaginando o voo de novas solidões

Mesmo que a cor do tempo desbote o vestido
E o tempo, lentamente, devore todos os sentidos

Neste exílio no presente arcabouço
Seremos a solidão do eco de todas as coisas
Deitados no ar sobre todas as cidades
Estaremos a sós na multidão sem rosto

Guardaremos a areia da solidão de muitos
Na ampulheta do tempo que nos devora

Nesse exílio de nós seremos lembranças
No caminho de pedras o esquecimento
Com a tua solidão e a minha solidão
E todas as solidões que inventamos

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

No caminho do ontem



Ikuko Kawai [Live.Concert.Tour.2005]4.The Way We Were


No teu azul lembrei do encanto
Que não me vitimasse o descuido
Guardando-te no azul da água
Do céu guardado nos olhos

Despi-me da roupagem do tempo
Numa repentina distração modesta
Vesti-me de tuas lembranças
Nos teus olhos pintei a cor do azul

Negros eram os longos cabelos
Fios brilhosos da longa espera
Divididos entre a emoção da razão
Como as misteriosas estrelas e a noite

No espelho d'água desenhei teu rosto
Te guardando noutras auroras de vida
Nos anos tatuados na barreira das mãos
Construídos na tua saudade silenciosa

No braço pousastes a mão trêmula
Enquanto os degraus dos passos seguiam
Em teu apoio meu coração palpitava
Alado, ao lado, brilhando aos olhos

Nos lábios finos encontro teu rosto
Nunca fostes em meu esquecimento
Mas ao lembrar-te esquecia de mim
Te reconstruí entre os meus pedaços

Recordei-te no doce do fruto
Saboreado na meiguice dos gestos
No aroma que reconhecido
Na mulher que germinastes

Habitavas meus lugares secretos
Nos amanheceres das minhas auroras
Despedi-me da tua ternura
Restou-me a noite, sem tornar-me dia

Saudades! Dessa palavra amiga.



sábado, 23 de fevereiro de 2013

No silêncio da chuva



IKUKO KAWAI-GREEN NOSTALGIA(Scarborough Fair/Green sleeves)


O sol deitou sobre a pele
Sulcando os caminhos do tempo
Repousando na face a desesperança
No desejo de chuva que te criastes

Venha a mulher que te fazes chuva
Sobre o leito de areia em aguaceiro

Das pedras quentes do chão
Moldei a tua estátua de sal
O doce beijo evaporado
Esquecido na última gota

Faz-se noite de chuva intensa
No sonho da alma purificada

Teu tempo traduz o silêncio
Dos olhares da terra seca
Dos anjos inúteis que sobrevoam
Sobre o branco dos cemitérios

No azul vestido de linho
Tuas curvas provocam as nuvens

No divino chão os estalos gritam
O som da terra rachada
Em retorcidos galhos secos
Mortos no miserável sempre

Os pássaros escondidos de chuva
No nublado jardim do aguaceiro

As nuvens acomodam trovões e raios
No alado tropel de mil cavalos
A noite se fará chuva no suspiro de agonia
Recomeçará no temporal o que sobrevive

Sem nordeste que nos fazem agreste
Violentos agrestes que nos tornam caatinga

Vestidas de chuva as mulheres cantarão
A voz da vida sobre todas as coisas
Tão grande o temporal cairá em chuva
De tanta chuva irá doer a vida

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

No colher das palavras



Amor Em Paz   Quarteto Morelenbaum


De onde vens capturando a alma
Se as palavras que escorrem no corpo
Deslizando na pele dos teus suores
As frases desnudam os teus sabores?

O que te fazes cativamente amada
Se a cada descoberta o paladar do novo
No misterioso segredo dos teus amores
Somam as mil mulheres de todas as fragrâncias?

Onde moras no encontro da felicidade
Em tornar-te a mulher de única essência
Sussurradamente pela tua voz rouca
No enlouquecido entoar das tuas palavras?

Apontarias o caminho dos pássaros
Se sois chamas acendendo  nas entrelinhas
Na penumbra anoitecendo na mulher amada
Repousando extasiada no meu olhar que se cala?

Porque habitas em todos os meus sonhos
Tão nua diante da tua beleza deitada
Se respiro-te profundo com o olhar emudecido
Sendo o teu refém na vaga sensação de vida?

Como ardes como a saudade que semeias
Acendendo o fogo acordado de brilho
Te preciso para viver nas fagulhas dormentes
Para viver-te o amor que voa no vaivém do sono

No sonho da poesia



Morelenbaum, Sakamoto - As Praias Desertas


Anoitece a mulher que sonha
Nos dourados raios sobre os pelos
Repousa no arrepio da pele
O suave afago por entre os cabelos

Abandonas na rósea face
Dos dias de espera
Dos minutos de mágoa
Na solidão amanhecida

Descaminhos no teu carinho
Num encontro de águas
Sou a palavra que não sacia
Na incompletude da sua sede

Vestindo as curvas no teu corpo
Onde meus olhos se perdem
Desenho nos teus lábios úmidos
O sonho das minhas palavras

Contorce a chama pelo vento
Na lentidão do tempo
Ardente pensamento do semear
A revelação de todos os desejos

A quietude sobre a cama
Tece versos indecentes
Reconfortando as almas
No suspirar eterno  do silêncio

As lágrimas vertendo o lamento
Em teu ventre dança a chama
Amordaça meus pobres planos
Na tua alma doce que acalenta

A flauta no ar do sopro
Na música  que sacia o fogo
No escuro que te procuro
Como a fresta por uma luz

Nas flores que se alimentam
Na doçura que te faz mel
Desenho o perfume do teu jardim
Na poesia o mágico instante

domingo, 10 de fevereiro de 2013

Memórias de chuva



Memoirs of a Geisha Soundtrack

Em proibida história te tornastes  
De um mundo delicado
Em ser contada não deverias
Proibida pelos teus mistérios 

Faz-se mistério para não sobreviver
Apenas em ser passante estranhamente

Torna-se água pela correnteza
Faz-se caminho por entre as pedras
Recria-se no novo caminho
Deixas o vazio evaporando-se

Resta-me mar que salga os peixes
Por entre os dedos somente me resto

Quisera não fosses da cor d'água
Faço-te olhos de um bosque
Tão enraizada feito terra
Numa árvore dos meus desejos

Resta-me floresta como seu templo
Salvo-me pedra gravando o teu poema
 
Dos teus olhos cor de chuva
Roubo o inesperado das palavras
Gravando-te na superfície da pele
As breves sentenças de inverno 

Torna-se chuva sobre as palavras que escrevo
Onde nada se lê, somente podes sentir   

O destino me trouxe o inverno
Numa visita inesperada
Feito água na tua cor de chuva
Apagando as frases com tua pressa

Teu jeito água de ser com pressa
Na beleza criada do mundo secreto

Em ti convive a agonia e a beleza
Onde meus dedos sangrarão 
Sobre os teus lábios vermelhos
Silenciosamente no coração te guarda

Lá fora escuto as janelas que escutam o segredo
O segredo que não se contém da inveja de ti

Nada permanece em esperança alguma
De morte lenta o coração morre
Olhando o futuro caindo do céu
Feito chuva sobre o poema

Recordações de felicidade feito sombras 
Esperança alguma se nada permanece 
Nas águas profundas dos teus olhos
No transparente segredo do teu rosto  

domingo, 3 de fevereiro de 2013

Que seja dito, quando for escrito



Adios nonino symphonic arr: Sverre Indris Joner

Tudo passou
Daquilo que não pudemos ser
Tudo restou no adeus
Como o nada que resiste

Haja o que houver
Não houve um adeus
Não o saberemos nunca
No tudo que ainda resta

O que eu disser
No tempo da negação
Por mais que insistas
Que seja escrito

As palavras que não colhi
Deslizam sobre o teu corpo
Como as gotas de suor
Que não sabem morrer

O teu amor sobre a cama
E o que eu pensar,
Que seja dito
Num amor que no sonho refaço

Refaço o desamor mil vezes
No meu pensar que resta
Ainda é cedo no talvez do amor
Nesse frágil amor que invento

O depois do adeus no tocar de lábios
No ideal lugar de encontro a despedida
O meu inferno todo se arrepende
De não haver no céu pecado

Descoberto o véu do sonho
No teu corpo indecifrado
Pergunta-me para que eu saiba
O que não sei em ti

Se eras as minhas frases soltas
De um disperso poema de amor
Mas ainda não o escrevi,
nem sei o título…