Apagar a imagem de alguém
Aquém perdida no tempo
Desaparecer do eu parado no vento
Do amor que ficou sem ar
Esquecer a alma do corpo inerte
Fechando o sorriso acanhado
Colorir a tua pele esmaecida
Levantando-te dessa pedra fria
Anestesiar a dor da ausência
Festejando essa mágoa solitatis*
Quebrar os ponteiros do relógio
Inventando a máquina do tempo
Misturar todos os sentimentos
Sendo o teu “achados e perdidos”
Recolher na trena todas as distâncias
Cobrindo com pontes todos os oceanos
Doar-te meu coração e transplantar-me o teu
Habitando-te em momentos infindos
Eternizando-me em teu corpo fatum*
Ser o teu porto seguro da nostalgia
Queimar todas as iguarias e temperos
Rasgando todas as tuas receitas
Tornar-me adstringente no amargo, no azedo
Jejuando-me de todas as tuas guloseimas
Inexistir o perto, o longe e o ausente
Segurando no dique todas as correntezas
Paralizar as órbitas dos planetas
Iluminando todos os meus subterrâneos
Conviver com todas as secas
Aterrando os olhos d'água
Salgar permanente todas as represas
Estimulando a sede na insalubridade
Exaurir o sentimento de poder
Enaltecendo o feio e o horroroso
No fracassado duelo com a soedade*
Declinando o teu sopro de vida
Abnegar-me de toda coragem
Tornando-me refém nessa batalha infinda
Num sentimento de diferentes vestes
Ora tecido de soidade*, ora de suidade*
Torpeçar na solitude cega no terreno
Abandonando a mais difícil tradução
Denunciando na incontrolável poética
O indecifrável desejo de “matar a saudade”
No armário de roupas restou teu perfume
Num vestido colorido de pequenas flores
Abraçando uma jaqueta anil desbotada
As diferentes cores ora tecidos pela saudade
(NA)* Saudade na forma arcaica: "soedade, soidade e suidade"
*Do latim solitatis* solidão, fatum* fado
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