quinta-feira, 31 de dezembro de 2009
Densa neblina
O horizonte se desfez na alvura
Na densa neblina que paira
Sobre todas as coisas criadas
Cores vivas e opacas empalideceram
Mantas brancas cobriram as encostas montanhosas
Suavemente desapareceram na somatória das cores
Os caminhos paralelos já não se fazem infinitos
Nem os cruzamentos para um eventual encontro
Restamos sós e a pouca paisagem que nos rodeia
Restamos nós e a pouca imagem de nos mesmos
O que nos dá prazer e em outro instante nos causa dor
Todos os amores, rancores, a face oculta que nos odeia
A imagem efêmera hiberna sem o espelho
Flutuando divinamente entre as nuvens
Nos confrontando com o inevitável fim
Na densa neblina de nós mesmos
Marcamos esse breve encontro
O ponto de partida para um novo recomeço
Em verdade a poesia
Em verdades escrevi o passado
Pois feito e sacramentado ficou
Em verdades escrevo o presente
Pois fato, dia-a-dia, sacramentado está
Em verdades escreverei o futuro
Pois se em viver mentiras
Nada restará ao presente
E o passado me negará
Traduzo os momentos em poesia
Pois os momentos existem
E nem é ilusória a poesia
Traduzida em cada palavra
Por ter uma face oculta
Que há em todas as pessoas
Tenho um pouco das vidas alheias
E nas vidas alheias há um pouco de mim
O rio da vida
Como vertendo para a vida
As lágrimas do primeiro choro
Guardado no instante nascente
Represada no insípido berço
Minando na alvura do papel
Como um leito de areia fina
Nasce a mistura divina
Cristalina água pura
Dos cumes das montanhas
Com a pureza das pedras preciosas
Faz nascer a vida em suas bordas
Vindo ao mundo empelicado para a morte
Vislumbrando o início das corredeiras
Murmurando canções entre as pedras
Assiste o verde por entre a densa mata
O ciclo da vida que nela se faz cúmplice
Ao encontro de outras vertentes
Unindo-se em outras deságuas
São pés de amoras, borboletas e pássaros
Em sinfonia ao som em natureza
Em vertiginoso desafio aos obstáculos
Erosando as margens sobre as pedras
Abre-se o véu em cachoeiras
Cristais em gotas coloridas de arco-íris
Sob o sol que evapora suas preces
Segue pelos vales e planícies
Irrigando as terras, as plantações
Saciando a sede dos animais
Abranda as aves nos raios de sol
Envolvendo os peixes colorindo o leito
Segue como rio curioso beirando as cidades
Recebendo o veneno daqueles que a sede sacia
Ressentes em teu leito de agonia
Densamente margeando as encostas
Lembras como o perfume era inodoro
Tão ingenuamente conduzindo a vida
O mar já não te auxilia em vida
Apenas o acolhe nos braços de areia
Como um filho morto pela avareza
Morrendo de tanta humanizada ignorância
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