Chanson pour Michelle - T. Jobim por Ryuichi Sakamoto
Um grito atravessa a noite surpresa
A indiferença acaricia o escaravelho
Em contínua caminhada se prolonga
Rola o seu tempo em seu mistério
Para que os mortos descansem
O motivo da morte
E possam morrer em paz
O tempo desfolha da inocência
Tormentos de um desejo imortal
Instantes que assombram um céu
Das últimas desesperanças
Assistem as vaidades que em mim respiram
Digeridas na ilusão das migalhas
Caídas da estreita mesa da sobrevivência
Renovo o tempo em que me invento
Renasço das cinzas num vazio de nada
O vazio que ressoa da alma em que me principio
No sentido da vida que se faz diante da morte
Nasço da fé dos deuses e do vento
Em descrenças de um feliz viver
Numa felicidade que nasça por mim
Invento a fé no distrair do tempo
Recrio-me na brancura da própria idéia
Incendeio-me à deriva dos risos soltos
Na louca beirada de cinzentas montanhas
Das minhas profundas guerras a sós
Numa língua danço as palavras no fogo
Tal qual monólogo de algum desperto
Um medo implacável de me habitar
No impossível querer morrer
Sem a canção de festa, o bater de braços
Sem a fé cega de escuro, um amor perdido do amor
O luar insinuando luas de palavras suspensas
Palidez rarefeita dos meus delírios sonhados
Nas incessantes metamorfoses de libertação
Aborto o deserto de um quase alvorecer
Bailo a dança noturna dos deuses
Uma criança cantalora na árvore do silêncio
E balança na palavra em que não existo
Nada se cria, apenas respira e recomeça
Numa inocência aberta de uma fonte de água fria
Renasço de um útero estéril de amanhã
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